sábado, 29 de março de 2008

Ainda o vídeo - Todos os professores são judeus

Aquele jovem que, filmando a cena, ia comentando "Altamente! A velha vai cair! Altamente!", imaginamo-lo muito bem membro das milícias hitlerianas que, desde 1933 até à guerra, se divertiam a seviciar judeus nas ruas, nas escolas, onde calhasse. Crueldade pura, puro fascismo.

quinta-feira, 27 de março de 2008

Recuperar algumas palavras que o eduquês pôs no "index"


A escola é, justamente, essa invenção recente, essa instituição que, nos alvores da galáxia tipográfica, se configurou como capaz de transmitir às novas gerações o património cultural (científico, artístico, filosófico) adquirido pelas gerações anteriores. Só pelo ensino, isto é, pela comunicação assimétrica de um saber entre sujeitos diferentemente situados face a esse saber (professor e aluno) esse património tem podido e pode continuar a ser salvo e prolongado, conservado e continuado.

Trata-se afinal de recuperar a dignidade da palavra ensino, ou seja, a crença no poder da assimetria da palavra escolar para operar essa transmissão. (sublinhados da autora)

Olga Pombo, A Escola, a Recta e o Círculo, Relógio D'Água

Elis Regina e Tom Jobim cantam "Soneto da separação", de Vinícius de Morais (música de Tom Jobim). Los Angeles, 1974

sexta-feira, 21 de março de 2008

Mozart - Requiem - Lacrimosa



Lacrimosa dies illa
qua resurget ex favilla
judicandus homo reus.
Huic ergo parce, Deus,
Pie Jesu, Jesu Domine,
dona eis requiem. Amen.

Dia de lágrimas, aquele
em que renascerá das cinzas,
para ser julgado,
o homem pecador.
Compadecei-Vos, pois, deste homem, ó Deus,
piedoso Senhor Jesus,
e concedei-lhe repouso eterno. Ámen.

Zeca Afonso - Canção de embalar

Crónica de Ferreira Fernandes, hoje, no Diário de Notícias

O Carolina Michaëlis, que já teve o belo nome de liceu, não serve os miúdos do bairro do Aleixo, no Porto. Não, aquele vídeo não mostra gente com desculpas fáceis, vindas do piorio. Pela localização daquela escola, quem para lá vai vive às voltas da Boavista e os pais têm jantes de liga leve sem precisar de as gamar. Os pais da miúda histérica que agride a professora de francês estarão nessa média. Os pais do miúdo besta que filma a cena, também. Tudo isso nos remete para a questão tão badalada das avaliações. Claro que não me permito avaliar a citada professora. A essa senhora só posso agradecer a coragem. E pedir-lhe perdão por a mandar para os cornos desses pequenos cobardolas sem lhe dar as condições de preencher a sua nobre profissão. Já avaliar os referidos pais, posso: pelo visto, e apesar das jantes de liga leve, valem pouco. O vídeo mostrou-o. É que se ele foi filmado numa sala de aula, o que mostrou foi a sala de jantar daqueles miúdos.

Poema de Daniel Faria (1971-1999)

Devo ser o último tempo
A chuva definitiva sobre o último animal nos pastos
O cadáver onde a aranha decide o círculo.
Devo ser o último degrau na escada de Jacob
E o último sonho nele
Devo ser-lhe a última dor no quadril.
Devo ser o mendigo à minha porta
E a casa posta à venda.
Devo ser o chão que me recebe
E a árvore que me planta.
Em silêncio e devagar no escuro
Devo ser a véspera. Devo ser o sal
Voltado para trás.
Ou a pergunta na hora de partir.

In: Anos 90 e Agora, Edições Quasi.

Fotografia de Robert Doisneau (1912-1994)


Madre Teresa de Calcutá (1910-1997): fé e escuridão

Em 1937, após a decisão de fundar as Missionárias da Caridade, Madre
Teresa de Calcutá, em carta a um seu antigo professor, escreve:

Não pense que a minha vida espiritual é um mar de rosas - que é flor que raramente encontro no meu caminho. Bem pelo contrário, o mais frequente é ter como companheira a 'escuridão'.

Madre Teresa de Calcutá, Vem, Sê a minha Luz, Alêtheia.

Mário Viegas diz "Mulheres e revolução", de Maria Velho da Costa

quinta-feira, 20 de março de 2008

Dá volta ao estômago

O vídeo "altamente" abriu os telejornais das televisões privadas. Informaram que a professora não apresentou queixa. Por certo para não ser duplamente enxovalhada. "Os da educação" interrogá-la-iam "de pé atrás", chamar-lhe-iam talvez "resistente à mudança" e outras coisas em eduquês perfeito. Sei que não vem a propósito, mas lembrei-me do caso de Felizberta no fundo do poço, assassinada aos poucos por jovens "irreverentes". Dá volta ao estômago.
Os do sindicato pediram - mal se acredita - mais autoridade para os professores. A reboque da realidade, finalmente.

Olivier Messiaen (1908-1992) - Louange à l'éternité de Jésus

Cesária Évora - "Lua nha testemunha"



Bô ka ta pensâ
nha kretxeu
Nen bô ka t'imajiâ,
o k'lonj di bó m ten sofridu.
.
Perguntâ
lua na séu
lua nha kompanhêra
di solidão.
Lua vagabunda di ispasu
ki ta konxê tud d'nha vida,
nha disventura,
El ê k' ta konta-bu
nha kretxeu
tud k'um ten sofridu
na ausênsia
y na distânsia.
.

Mundu, bô ten roladu ku mi
num jogu di kabra-séga,
sempri ta persigi-m,
Pa kada volta ki mundu da
el ta traze-m un dor
pa m txiga más pa Déuz

Crioulos de base portuguesa



Da autoria de Dulce Pereira, é o número 3 da Colecção "O essencial sobre Língua Portuguesa", da Caminho.
Parte-se do princípio, hoje consensual (mas ainda quase só entre os estudiosos), de que um crioulo é uma língua natural, formada a partir de um específico contacto entre línguas, em que há um claro predomínio, embora mais lexical do que gramatical, da língua de superstrato, que aufere de mais prestígio e poder funcional.
A língua portuguesa, associada a circunstâncias históricas conhecidas, está na origem de crioulos de grande vitalidade, como é o caso muito especial do cabo-verdiano, uma língua que também por cá se fala, "inclusive" nos pátios das nossas escolas. Outros crioulos africanos de base lusa são os da Guiné-Bissau e os de São Tomé e do Príncipe. Tudo no plural, porque, num mesmo país, os crioulos não são uniformes e dependem das línguas de substrato. No Oriente, a autora refere o Korlai, na Índia, e Papia Kristang, em Malaca - ambos ainda vivos.
Em Angola e em Moçambique não se desenvolveram crioulos, o que reforça a convicção de que essas línguas emergem num clima de marcada insularidade, ou, pelo menos, em espaços circunscritos em que se concentraram populações de origens muito diversificadas.
Na época pós-colonial em que vivemos, as línguas crioulas (e com elas as culturas crioulas), em particular as de base portuguesa, são realidades linguísticas e, "latu sensu", culturais em que se depositam legítimas expectativas.


Transcrevo do livro um breve texto escrito em crioulo cabo-verdiano, seguido da tradução em Português:

Gjoka Maninha, dispos d'uns anu na Sul, e ranja getu e ben tera mata sodadi p'e odja modi ki kusas sta. Familia fika pa tras. Asi si nisisidadi panha-l ta susti-el so.
E txiga, kabu ka staba sima e dexaba. Kusas nobu pa tudu banda. Pilorinhu fartu. Tera libri sen skrabatura ki fulia-l pa kosta baxu.

Joca Maninha, depois de uns anos do Sul [São Tomé], arranjou forma de vir à terra matar saudades, para ver como as coisas estavam. A família ficou para trás. Assim, se passasse necessidades, aguentava-as sozinho.
Chegou, o sítio não estava como ele o tinha deixado. Coisas novas por toda a parte. O mercado farto. A terra, livre, sem a escravatura que o tinha enviado pela Costa abaixo.

quarta-feira, 19 de março de 2008

Chet Baker - Almost blue (de Elvis Costello)

"Carta a meus filhos sobre os fuzilamentos de Goya", de Jorge de Sena











Não sei, meus filhos, que mundo será o vosso.
É possível, porque tudo é possível, que ele seja
aquele que eu desejo para vós. Um simples mundo,
onde tudo tenha apenas a dificuldade que advém
de nada haver que não seja simples e natural.
Um mundo em que tudo seja permitido,
conforme o vosso gosto, o vosso anseio, o vosso prazer,
o vosso respeito pelos outros, o respeito dos outros por vós.
E é possível que não seja isto, nem seja sequer isto
que vos interesse para viver. Tudo é possível,
ainda quando lutemos, como devemos lutar,
por quanto nos pareça a liberdade e a justiça,
ou mais que qualquer uma delas uma fiel
dedicação à honra de estar vivo.
Um dia sabereis que mais que a humanidade
não tem conta o número dos que pensaram assim,
amaram o seu semelhante no que ele tinha de único,
de insólito, de livre, de diferente,
e foram sacrificados, torturados, espancados,
e entregues hipocritamente à secular justiça,
para que os liquidasse "com suma piedade e sem efusão de sangue."
Por serem fiéis a um deus, a um pensamento,
a uma pátria, uma esperança, ou muito apenas
à fome irrespondível que lhes roía as entranhas,
foram estripados, esfolados, queimados, gaseados,
e os seus corpos amontoados tão anonimamente quanto haviam vivido,
ou as suas cinzas dispersas para que delas não restasse memória.
Às vezes, por serem de uma raça, outras
por serem de uma classe, expiaram todos
os erros que não tinham cometido ou não tinham consciência
de haver cometido. Mas também aconteceu
e acontece que não foram mortos.
Houve sempre infinitas maneiras de prevalecer,
aniquilando mansamente, delicadamente,
por ínvios caminhos quais se diz que são ínvios os de Deus.
Estes fuzilamentos, este heroísmo, este horror,
foi uma coisa, entre mil, acontecida em Espanha
há mais de um século e que por violenta e injusta
ofendeu o coração de um pintor chamado Goya,
que tinha um coração muito grande, cheio de fúria
e de amor. Mas isto nada é, meus filhos.
Apenas um episódio, um episódio breve,
nesta cadeia de que sois um elo (ou não sereis)
de ferro e de suor e sangue e algum sémen
a caminho do mundo que vos sonho.
Acreditai que nenhum mundo, que nada nem ninguém
vale mais que uma vida ou a alegria de tê-la.
É isto o que mais importa - essa alegria.
Acreditai que a dignidade em que hão-de falar-vos tanto
não é senão essa alegria que vem
de estar-se vivo e sabendo que nenhuma vez
alguém está menos vivo ou sofre ou morre
para que um só de vós resista um pouco mais
à morte que é de todos e virá.
Que tudo isto sabereis serenamente,
sem culpas a ninguém, sem terror, sem ambição,
e sobretudo sem desapego ou indiferença,
ardentemente espero. Tanto sangue,
tanta dor, tanta angústia, um dia
- mesmo que o tédio de um mundo feliz vos persiga -
não hão-de ser em vão. Confesso que
muitas vezes, pensando no horror de tantos séculos
de opressão e crueldade, hesito por momentos
e uma amargura me submerge inconsolável.
Serão ou não em vão? Mas, mesmo que o não sejam,
quem ressuscita esses milhões, quem restitui
não só a vida, mas tudo o que lhes foi tirado?
Nenhum Juízo Final, meus filhos, pode dar-lhes
aquele instante que não viveram, aquele objecto
que não fruíram, aquele gestode amor, que fariam "amanhã".
E, por isso, o mesmo mundo que criemos
nos cumpre tê-lo com cuidado, como coisa
que não é só nossa, que nos é cedida
ara a guardarmos respeitosamente
em memória do sangue que nos corre nas veias,
da nossa carne que foi outra, do amor que
outros não amaram porque lho roubaram.

Lisboa, 25 de Junho de 1959

"Ainda me acolho", de António Osório

Ainda me acolho, Pai,
à tua madressilva.
Ali tens a passiflora,
não envelheceu.
O cedro grande, maior ainda.
O forno, dedadas
expungidas pelas portas.
A buganvília, não esqueço,
é preciso cortá-la.
A Mãe não está nem volta.

Josefa de Óbidos - S. José e o Menino (1670)

Torre de Babel, de Brueghel o Velho

Ficha 28 - Colocação de vírgulas (1)

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terça-feira, 18 de março de 2008

domingo, 16 de março de 2008

Tokyo Hotel

A minha filha, de 13 anos, vai hoje ao concerto da banda Tokyo Hotel. É às sete e meia e tudo. A esta hora, já o pavilhão Atlântico deve estar cheio de alunos nossos -infantes e pré-adolescentes -, afora os que não puderam ir. Não conhecia a banda e, presumindo que muitos dos visitantes do blogue também não, partilho uma canção "sacada" no "you tube". Para "être à la page".


Ficha 26 - Acento tónico, acento gráfico e classificação das palavras quanto à posição da sílaba tónica

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Jane Birkin interpreta "Avec le temps", de Léo Ferré

Martin Heidegger (1889-1976) - mais do que uma ressalva



Durante muitos anos da sua vida adulta, este homenzinho considerou Hitler um político "prestável".
Durante muitos anos da sua vida adulta, este grande pensador foi simpatizante do nazismo.

Marie Devellereau canta "Je te veux", de Eric Satie

Um tal Fernando Assis Pacheco


Vivo com ele há anos suficientes
para poder dizer que o reconheceria
num dia de Novembro no meio da bruma
é como uma pessoa de família

Do poema dele próprio "Um tal Fernando Assis Pacheco", Respiração Assistida, Assírio & Alvim.

Inícios auspiciosos (4)


Eles eram jovens, licenciados, ambos virgens naquela sua noite de núpcias, e viviam numa época em que uma conversa sobre dificuldades sexuais, que nunca é fácil, era simplesmente impossível. Estavam ambos sentados a jantar numa sala minúscula no primeiro andar de uma estalagam georgiana. Na sala ao lado, através da porta aberta, via-se uma cama de colunas, com uma colcha de um branco imaculado e espantosamente lisa, como se tivesse sido esticada por qualquer mão não humana. Edward não referia que, até então, nunca havia ficado num hotal, enquanto Florance, após muitas viagens que fizera com o pai, já tinha vasta experiência nesse domínio. Superficialmente, estavam bem-dispostos. O seu casamento, na igreja de St. Mary, em Oxford, tinha corrido bem; o serviço religioso foi correcto, a recepção divertida, a despedida dos amigos da escola e da faculdade ruidosa e animada.


Ian McEwan, Na Praia de Chesil, trad. de Ana Falcão Bastos, Gradiva.

Veleiros, de Paul Klee (1879-1940)

Ficha 25 - Hiperónimos / Hipónimos

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sábado, 15 de março de 2008

Stacey Kent canta tão bem "Ces petits riens", de Serge Gainsbourg

Ninguém diz que é um crime

Há já vários anos que Camilo Castelo Branco desapareceu dos programas de Português do ensino secundário. Não só ele, evidentemente, mas ele, em particular, é o caso mais chocante. As mentes brilhantes que cortaram a novela "Amor de Perdição" deverão ter pensado, no seu "modernacismo" tacanho, que a história é uma patetice: morrem todos no fim, os gajos mal se chegam a tocar, aquela personagem "humilde" chamada Mariana é totalmente lamechas, aquelas cartas são insuportáveis e hoje os adolescentes já não se escrevem e já não se apaixonam assim, por aí fora. Deverão ter pensado depois que seria muito mais "pedagógico" que os "aprendentes" (sic) se iniciassem nos requerimentos e outros "textos transaccionais" (sic). Tudo mais "ligado à vida", mais "utilitário". Afinal, para que servem novelas passionais?
Os milhares de adolescentes que todos os anos saem do secundário ficam, assim, privados da leitura orientada de um clássico da literatura portuguesa. A maior parte, para o resto da vida. Ninguém parece dar pela falta. Ninguém manifesta a menor indignação. Ninguém diz que é um crime - que suponho que era o que diriam os ingleses se lhes retirassem da escola o "Romeu e Julieta".

quinta-feira, 13 de março de 2008

Um aforismo de Oscar Wilde

Ter sido bem educado é um grande problema nos dias que correm. Quantas portas nos são fechadas...

terça-feira, 11 de março de 2008

Cristina Branco - Vocábulo Redondo (Zeca Afonso)

Ficha 24 - Adjectivos étnicos (1)

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Inícios auspiciosos (3)

1.
Nasci num tempo em que a maioria dos jovens haviam perdido a crença em Deus, pela mesma razão que os seus maiores a haviam tido - sem porquê. E então, porque o espírito humano tende naturalmente para criticar porque sente, e não porque pensa, a maioria desses jovens escolheu a Humanidade para sucedâneo de Deus. Pertenço, porém, àquela espécie de homens que estão sempre na margem daquilo a que pertencem, nem vêem só a multidão de que são, senão também os grandes espaços que há ao lado. Por isso nem abandonei Deus tão amplamente como eles, nem aceitei nunca a Humanidade. Considerei que Deus, sendo improvável, poderia ser, podendo pois dever ser adorado; mas que a Humanidade, sendo uma mera ideia biológica, e não significando mais que a espécie animal humana, não era mais digna de adoração do que qualquer outra espécie animal. Este culto da Humanidade, com seus ritos de Liberdade e Igualdade, pareceu-me sempre uma revivescência dos cultos antigos, em que animais eram como deuses, ou os deuses tinham cabeças de animais.
Assim, não sabendo crer em Deus, e não podendo crer numa soma de animais, fiquei, como outros da orla das gentes, naquela distância de tudo a que comummente se chama a Decadência. A Decadência é a perda total de inconsciência; porque a inconsciência é o fundamento da vida. O coração, se pudesse pensar, pararia.

Bernardo Soares, Livro do Desassossego, edição de Richard Zenith, Assírio & Alvim.

segunda-feira, 10 de março de 2008

Caminho


A mão que escreve



A mão que escreve é sempre a outra.

Norma e variação

De Maria Helena Mira Mateus e Esperança Cardeira, este é o sétimo livrinho, saído há pouco, da colecção O Essencial sobre Língua Portuguesa, que compreenderá ao todo vinte pequenos volumes. Para docentes de Português, que por excelência são os portadores da norma culta (muito justamente ligada à escrita, que é a grande razão de ser da disciplina de Português língua materna), a que a escola não se pode - nem deve - eximir, os conceitos de norma e variação, fazendo jus ao nome da colecção, são absolutamente essenciais. É que os professores de Português vivem na confluência, nem sempre fácil de gerir, entre o oral e o escrito, entre a norma culta e as variedades de uso, isto sem falar da língua literária e da sua diversíssima paleta de registos.
Quase todos de autoria de professores de Linguística da Faculdade de Letras de Lisboa (à excepção do anterior, Semântica, de Ana Cristina Macário Lopes e Graça Rio-Torto, de Coimbra), estes livros breves são uma grande obra de estudiosos que durante demasiados anos falaram quase exclusivamente para os pares, quando não só para os pares da mesma "escola" linguística.
Cada volume não chega a custar cinco euros. Da Editorial Caminho.

domingo, 9 de março de 2008

Manifestação (5)

Já noite fria, dirigia-me com o grupo da minha escola para o Cais do Sodré, entre milhares que iam apanhar o autocarro de regresso. Alguém disse, ao micro, "boa viagem" e caiu bem. Lembrei-me de uns versos de Ruy Belo, que agora, lembrando-me de que os lembrei, cito de livro na mão:

Por vezes os homens juntam-se todos
ou quase todos e organizam
grandes manifestações. Mas nada disso os dispensa
da grande solidão da morte
de termos de morrer cada um por nossa conta

Manifestação (4)

Teria sido justo que se tivesse ouvido no Terreiro do Paço um professor que não fosse sindicalista. Digamos, um homem ou uma mulher que na sexta-feira passada tivesse estado com alunos. Teria com certeza infinitamente mais representatividade do que os oradores dos pequenos sindicatos - com aquelas patuscas designações que se distinguem às vezes só pela ordem das palavras - que toda a gente sabe a quem fundamentalmente servem.

Manifestação (3)

Compareceram algumas pessoas públicas, foram vistas. A Avenida é sempre a descer. Uma senhora que parecia ser Ana Benavente, seria por certo uma sua sósia, pois não acredito que. Quando me aproximei de Maria Filomena Mónica, sentada num banco a meio da Avenida, estava um grupo de professores a agradecer-lhe o texto que escreveu acerca de um secretário de estado. De ambos os lados da Avenida, houve sempre muita gente a olhar com aprovação para os manifestantes. Algumas pessoas batiam palmas, faziam que sim com a cabeça, sorriam muito humanamente. A rua é um lugar feliz, afinal.

Manifestação (2)

Já no autocarro, antes de iniciarmos o regresso, o João Alfaro, que dinamizou o organização da viagem, pegou no microfone, disse umas palavras comovidas e concluiu:

- Parafraseando um já célebre comentário, "foi porreiro, pá!"

sábado, 8 de março de 2008

Manifestação (1)

Fiquei impressionado. Já calculava, pelo que me apercebi na minha escola, que os professores mais velhos marcariam forte presença. Gente competente, gente quase toda sem partido e sem sindicato, gente que foi pela primiera vez para a rua ou que a ela regressou após tantos anos, gente que está farta. Mas também compareceram muitos jovens, esses que já perceberam que a "cubanização" do ensino público está em curso, pondo-os "borda fora" da classe média e retirando-lhes aquele mínimo de independência sem o qual não faz sentido ser professor.

Exageros

Cheguei a casa, liguei a televisão para ver o jornal da 2, passava um excerto de uma entrevista que a ministra Maria de Lurdes Rodrigues dera ao final da tarde. À pergunta "E agora, tudo na mesma?", a ministra respondeu com aquele, tão seu, ar compungido e muito ciente da missão salvívica que sobre os seus ombros impende: "O país não pode esperar."
É extraordinário. O país não pode esperar?? Mas não pode esperar por quê? Pela implementação da sua proposta de avaliação de professores? Temos, pois, não apenas as escolas, mas o país - talvez mesmo a União, por que não o mundo? - em suspenso, quiçá totalmente paralisados, ou até, que digo eu?, em perigo de vida, à espera que se faça a avaliação de professores que a senhora ministra e a sua equipa propõem. Hélas!

sexta-feira, 7 de março de 2008

Caminho


Francisco José Viegas a ministro!

Transcrevo, com a devida vénia, um excerto de um texto postado hoje por Francisco José Viegas, no seu blogue "A origem das espécies". Clarividente. Nenhum professor, mesmo dos melhores, diria melhor.

Essa vontade de disciplinar os professores, eu percebo-a. Durante trinta anos, uma série de funcionários que abundou “pelos corredores do ME” (gosto da expressão, eu sei), decretou e planeou coisas inenarráveis para as escolas – sem as visitar, sem as conhecer, ignorando que essa geringonça de “planeamento”, “objectivos”, princípios pedagógicos modernos, funcionava muito bem nas suas cabecinhas mas que era necessário testar tudo nas escolas, que não podem ser laboratórios para experiências engenhosas. Muitos professores foram desmotivados ao longo destes anos. Ou porque os processos disciplinares eram longos depois de uma agressão (o ME ignora que esses processos devem ser rápidos e decisivos), ou porque ninguém sabe como a TLEBS é aplicada. Ninguém, que eu tivesse ouvido nas escolas onde vou, discordou da necessidade avaliação. Mas eu agradecia que se avaliasse também o trabalho do ME durante estes últimos anos; que se avaliasse o quanto o ME trabalhou para dificultar a vida nas escolas, com medidas insensatas, inadequadas e incompreensíveis; que se avalie a qualidade dos programas de ensino e a sua linguagem imprópria e incompreensível. Sou e sempre fui dos primeiros a pedir avaliação aos professores, porque é uma exigência democrática e que pode ajudar a melhorar a qualidade do ensino. Mas é fácil escolher os professores como bodes expiatórios de toda a desgraça “do sistema”, como se tivessem sido eles a deixar apodrecer as escolas ou a introduzir reformas sobre reformas, a maior parte delas abandonadas uns anos depois. Por isso, quando pedirem “justiça”, e “disciplina” e “rigor” (coisas elementares), não se esqueçam de visitar as escolas, de ver como é a vida dos professores, porque creio que se confunde em demasia aquilo que é “o mundo dos professores” com a imagem pública de um sistema desorganizado, oportunista e feito para produzir estatísticas boas para a propaganda.

Joel Serrão (1919-2008)


Aquela boa parte de nós que é Cesário Verde deve-o a Joel Serrão, um historiador que leu poetas e os deu a ler. Foi profesor de liceu durante trinta anos.

quinta-feira, 6 de março de 2008

Cardoso Pires inédito





Um inédito do autor da prosa mais enxuta do século XX acaba de sair pela mão da nova editora de Nelson Matos, que tem o seu nome, prometendo os "seus livros". Ainda não li. A capa é excelente, afora a bolinha, que bem podia ser uma faixa.

quarta-feira, 5 de março de 2008

O Público faz 18 anos

Há dezoito anos que sou leitor do Público quase todos os dias. De férias, já tenho feito quilómetros para comprar o Público. Já tenho comprado o Público para só mal o folhear no dia seguinte. Já comprei o mesmo Público duas vezes, por qualquer razão prática ou distracção. Já fiz centenas e centenas de recortes do Público para ler mais tarde e já os deitei fora sem os ter lido. Já andei, barata-tonta, de quiosque em quiosque para comprar o Público. Já escrevi cartas ao director do Público. Já desejei ter uma coluna no Público. Alguns dias me faltou alguma coisa, quando já não consegui ler o Público.

Deixem-nos ensinar!

Por que vou à manifestação de sábado, dia 8:

É hora de dizer "basta!" à crescente degradação da função de ensinar e à consequente desvalorização simbólica e material do professor. A sociedade incumbe-nos da missão de passarmos o legado aos que nos vão suceder, para que o mundo não volte para trás, para que a barbárie não regresse. Não podemos permitir - e seremos irresponsáveis, se o permitirmos - que nos inutilizem, como se a transmissão de saberes e valores aos mais novos não fosse afinal o essencial do que fazemos.

Para além disso, esta proposta de avaliação dos professores é uma enormidade burocrática, que ameaça seriamente degradar ainda mais a condição docente. O reconhecimento dos "melhores", como se apregoa, é só não lhes retirarem a dignidade e a autoridade de serem pessoas co-responsáveis pela instrução e educação dos mais novos. Nenhum "melhor" quer ser premiado - isso é o elementar da ética. Os "piores", uma minoria que tem estado no sistema (no sistema, digo bem) de ensino como peixe na água, também não irão melhorar com esta avaliação, que não avalia o essencial, que é o saber do professor e o rigor e entusiasmo com que o transmite, num justo equilíbrio entre o seu percurso curricular e o desempenho junto dos alunos.
Na manifestação de sábado, bastava esta palavra de ordem:

Ministra, secretários,
ouçam bem, vocês:
os professores estão fartos
de tanto eduquês!

segunda-feira, 3 de março de 2008

Praia de Vale Furado (perto da Nazaré)



Ficha 21 - Qual a palavra primitiva?

(níveis recomendados: 7º, 8º e 9º anos)

http://www.scribd.com/doc/2210172/QUAL-A-PALAVRA-PRIMITIVA

Ficha 20 - Três figuras de estilo

(níveis recomendados: 6º e 7º anos)

http://www.scribd.com/doc/2209807/TRES-FIGURAS-DE-ESTILO

Perguntas mais do que retóricas


Vasco Pulido Valente, ontem, no Público:

Como se pode avaliar professores, quando o Estado sistematicamente os "deseducou" durante 30 anos? Como se pode avaliar professores, quando o "ethos" do "sistema de ensino" foi durante 30 anos conservar e fazer progredir na escola qualquer aluno que lá entrasse? Como se pode avaliar professores, se a ortodoxia pedagógica durante 30 anos lhes tirou pouco a pouco a mais leve sombra de autoridade e prestígio? Como se pode avaliar professores, se a disciplina e a hierarquia se dissolveram? Como se pode avaliar professores, se ninguém se entende sobre o que devem ser os "curricula" e os programas? Como se pode avaliar professores , se a própria sociedade não tem um modelo do "homem" ou da "mulher" que se deve "formar" ou "instruir"?

Ficha 19 - Palavra intrusa

http://www.scribd.com/doc/2209340/PALAVRA-INTRUSA

Maria Gabriela Llansol



Maria Gabriela Llansol (Lisboa, 24/11/1931 - Sintra, 3/3/2008)

Em primeiro lugar, há a própria verticalidade do rosto, a sua exposição íntegra, sem defesa. A pele do rosto é a que permanece mais nua, mais despida. A mais nua, se bem que de uma nudez decente. A mais despida também: há no rosto uma pobreza essencial: a prova disto é que se procura mascarar tal pobreza assumindo atitudes, disfarçando. O rosto está exposto, ameaçado, como se nos convidasse a um acto de violência. Ao mesmo tempo, o rosto é o que nos proíbe de matar. (...) No acesso ao rosto, há certamente também um acesso à ideia de Deus.

(Emmanuel Levinas, Ética e Infinito, Edições 70)

domingo, 2 de março de 2008

Um aforismo de Walter Benjamin (1892-1940)





Ser feliz é poder tomar consciência de si sem apanhar um susto.

(in: Imagens de Pensamento, trad. de João Barrento, Assírio & Alvim)

Caminho


Ficha 18 - Treino para consulta do dicionário (1)

(níveis recomendados: 3º, 4º e 5º anos)

http://www.scribd.com/doc/2203348/TREINO-PARA-CONSULTA-DO-DICIONARIO-1

Ficha 17 - Verbos que designam vozes de animais

http://www.scribd.com/doc/2203190/VERBOS-QUE-DESIGNAM-VOZES-DE-ANIMAIS

Casa-estúdio do fotógrafo José Relvas (1858-1929)




Visitável, em horário de expediente público, de terça a Domingo, na Golegã. Com interesse também para visitas escolares.

Ficha 16 - Via popular e via erudita

http://www.scribd.com/doc/2202332/DO-LATIM-AO-PORTUGUES-1

A propósito de citações


Traduzo, do Magazine Littéraire de Março/08, as primeiras frases da crónica de Enrique Vila-Matas, com o título "Le plaisir des citations":

Gosto das citatações, essas linhas estrangeiras que incluímos nos nossos próprios textos. Não compreendo aqueles que as detestam e afirmam estupidamente que "para escrever, é preciso nada dever a ninguém".

Inícios auspiciosos (2)


Fala-me, Musa, do homem astuto que tanto vagueou,
depois que de Tróia destruiu a cidadela sagrada.
Muitos foram os povos cujas cidades observou,
cujos espíritos conheceu; e foram muitos no mar
os sofrimentos por que passou para salvar a vida,
para conseguir o retorno dos companheiros a suas casas.
Mas a eles, embora o quisesse, não logrou salvar.
Não, pereceram devido à sua loucura,
insensatos, que devoraram o gado sagrado de Hiperíon,
o Sol - e assim lhes negou o deus o dia do retorno.
Destas coisas fala-nos agora, ó deusa, filha de Zeus.

Homero, Odisseia, tradução de Frederico Lourenço, Livros Cotovia

sábado, 1 de março de 2008

Homem de pouca fé, por que duvidaste?

Jesus caminha sobre as águas

Depois, Jesus obrigou os discípulos a embarcar e a ir adiante para a outra margem, enquanto Ele despedia as multidões. Logo que as despediu, subiu a um monte para orar na solidão. E, chegada a noite, estava ali só. A barca encontrava-se já a várias centenas de metros da terra, açoitada pelas ondas, pois o vento era contrário.
De madrugada, Jesus foi ter com eles, caminhando sobre o mar. Ao verem-no caminhar sobre o mar, os discípulos assustaram-se e disseram: "É um fantasma!" E gritaram com medo. No mesmo instante, Jesus falou-lhes, dizendo: "Tranquilizai-vos! Sou eu! Não temais!" Pedro respondeu-lhe: "Se és Tu, Senhor, manda-me ir ter contigo sobre as águas." "Vem" - disse Jesus. Mas, sentindo a violência do vento, teve medo e, começando a ir ao fundo, gritou: "Salva-me, Senhor!" Imediatamente Jesus estendeu-lhe a mão, segurou-o e disse-lhe: "Homem de pouca fé, por que duvidaste?" E quando entraram na barca, o vento amainou. (...)
Nova Bíblia dos Capuchinhos, Evangelho segundo S. Mateus

Ficha 15 - Formação de advérbios com o sufixo "-mente"


http://www.scribd.com/doc/2198811/ADVERBIOS-FORMADOS-COM-O-SUFIXO-MENTE

"Os Lusíadas" e a "Mensagem"

http://www.scribd.com/doc/2198747/Os-Lusiadas-e-Mensagem

Excerto de texto de Pacheco Pereira na "Sábado"

(...) Os professores no seu conjunto eram tidos como os grandes responsáveis pelo que se passava nas escolas e embora houvesse outros alvos, o Ministério, o laxismo, o “eduquês”, os sindicatos, acabava sempre por sobrar para os professores. Os professores tinham uma óbvia responsabilidade por esta situação e tinham-se posto a jeito. Embora houvesse professores que individualmente expressassem o seu descontentamento com o “eduquês”, o facilitismo, a falta de hierarquia de mérito entre os próprios professores, o absentismo, o desleixo e a má preparação de muitos profissionais, a ausência de avaliação digna desse nome, a sindicalização do Ministério, não havia um sólido movimento de opinião entre os professores que exigisse reformas e isso permitiu a demonização dos professores enquanto classe profissional. Mas havia professores com estas preocupações e estes deveriam ser os aliados naturais de uma política de reformas como a que a Ministra quis realizar. Só que não há, não há ninguém, é difícil encontrar alguém, em qualquer escola do país, que apoie a Ministra, que é universalmente odiada pelos professores. Uso a palavra forte, “odiar”, porque é raro encontrar algum responsável ministerial mais sozinho que a Ministra da Educação e isso, por si só, mostra que alguma coisa falhou nas suas reformas, porque, por escassos que fossem, alguns aliados deveriam existir, 10%, 5% dos professores, 3 ou 2% para se conseguir ter sucesso.(…)A Ministra bem pode mandar, como Jeová, os Anjos a Sodoma e Gomorra à procura de um justo, que não encontra ninguém.(...)

Ficha 14 - Actos ilocutórios

(níveis recomendados: 10º e 11º anos)

http://www.scribd.com/doc/2194898/IDENTIFICACAO-DE-ACTOS-ILOCUTORIOS