segunda-feira, 5 de maio de 2008

Ó da guarda, que vamos ficar sem as consoantes 'mudas'!


Circula agora por aí uma petição contra o Acordo Ortográfico, em que se fala com "profunda indignação" contra a supressão das consoantes etimológicas não articuladas 'c' e 'p', que seriam essenciais para as vogais abertas que as antecedem se manterem abertas. A verdade é que o argumento colhe muito pouco, porquanto em 'actriz' ou em 'actual', a presença do 'c' não impediu que o 'a' fechasse. Infelizmente, a redução das vogais não tónicas é uma característica do português europeu, e isso, de facto, não abona nada a favor da sonoridade da variante europeia da nossa língua, que fica muito mais tristonha de se ouvir. Mas defender a pés juntos que são as consoantes "mudas" que impedem a redução do timbre das vogais é claramente um argumento pobre, tanto mais que essas consoantes só existem na escrita. Com o número de leitores que temos...
Ainda por cima, temos exemplos que atestam o contrário: em 'inflação' ou 'translação', não consta que o 'a' esteja a fechar e estas palavras não têm qualquer consoante 'muda'. Por outro lado, que se saiba, os brasileiros estão longe de fechar o 'e' de selecção e já há muitos anos que escrevem e lêem 'seleção'. Também nos (imensos) pares de homógrafas sem acento gráfico distintivo - eu namoro / o namoro, eu começo / o começo - a vogal aberta, embora aí seja tónica, não fechou, e não há qualquer sinal gráfico a sinalizar a sua abertura.
Na verdade, pode-se discutir uma ou outra "solução" que o Acordo propõe, mas o tão estafado argumento das consoantes etimológicas não articuladas parece-me um pouco preguiçoso.

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